Quatro Constituições Conciliares (Parte II)

Mons. Vitaliano explica as quatro Constituições do Concílio Vaticano II

CRATO, segunda-feira, 24 de setembro de 2012 (ZENIT.org) – Publicamos a seguir a segunda parte do artigo que Mons. Vitaliano escreveu na sexta-feira, sobre as quatro Constituições do Vaticano II. Para ler a primeira parte clique aqui (http://www.zenit.org/article-31359?l=portuguese)

Constituição Dogmática sobre a Revelação: Dei Verbum, 18 de Novembro de 1965.

Documento de fundamental importância para a compreensão da Palavra de Deus e da relação com o Magistério da Igreja. Deus tem falado aos homens. O Cristo, Palavra (Verbo) de Deus, por quem todas as coisas foram criadas, é a plenitude da Revelação. A Constituição mostra como na Sagrada Escritura se encontra a Palavra de Deus fixada por escrito sob a inspiração do Espírito Santo, enquanto que a Palavra de Deus, confiada por Cristo aos Apóstolos, é transmitida pela Tradição integralmente aos sucessores dos apóstolos. A Hierarquia tem a tarefa de interpretar autenticamente a Palavra de Deus. Este aspecto é analisado no segundo capítulo (n. 7-10). O problema que mais ocupou a Assembleia Conciliar foi exatamente o das fontes da Revelação: só a Sagrada Escritura ou também a Tradição (a interpretação da Igreja ao longo dos séculos). O texto estabeleceu que existem duas fontes da Revelação: a S. Escritura e a Tradição da Igreja. Alguns passos fundamentais: “Relação entre a Sagrada Tradição e a Sagrada Escritura. A Sagrada Tradição, portanto, e a Sagrada Escritura estão intimamente unidas e compenetradas entre si. Com efeito, decorrente ambas da mesma fonte divina, fazem como que uma só coisa e tendem ao mesmo fim. A Sagrada Escritura é a palavra de Deus enquanto que foi escrita por inspiração do Espírito Santo; a Sagrada Tradição, por sua vez transmite integralmente aos sucessores dos Apóstolos a palavra de Deus confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos Apóstolos…  Disso resulta que a Igreja não tira só da Sagrada Escritura a sua certeza a respeito de todas as coisas reveladas. Por isso, ambas devem ser recebidas e veneradas com igual espírito de piedade e reverência (n. 9). Relação de uma e outra com a Igreja e com o Magistério eclesiástico.  A sagrada Tradição e a Sagrada Escritura constituem um só depósito sagrado da palavra de Deus, confiado à Igreja…Porém, o encargo de interpretar autênticamente a palavra de Deus escrita ou contida na Tradição, foi confiado só ao magistério vivo da Igreja, cuja autoridade é exercida em nome de Jesus Cristo. Este magistério não está acima da palavra de Deus, mas sim ao seu serviço, ensinando apenas o que foi transmitido… É claro, portanto, que a Sagrada Tradição, a Sagrada Escritura e o Magistério da Igreja, segundo o sapientíssimo desígnio de Deus, de tal maneira se unem e se associam que um sem o outro não se mantém, e todos juntos, cada um a seu modo, sob a ação do mesmo Espírito Santo, contribuem eficazmente para a salvação das almas”.  Finalmente, a Constituição enfatiza o papel fundamental que deve ter as Escrituras em toda a vida da Igreja.

Constituição sobre a Igreja no mundo do nosso tempo: Gaudium et Spes, 7 de Dezembro de 1965.

Esta Constituição está formada por uma primeira parte sobre a vocação do homem, e por uma segunda sobre alguns problemas mais urgentes. Uma introdução descreve primeiramente a condição do mundo de hoje, com as suas profundas transformações, as suas esperanças e os seus medos. A Igreja quer captar tudo o que seja sinal da presença e da vontade de Deus nos acontecimentos, nas exigências e aspirações dos homens. A primeira parte responde a algumas perguntas: o que a Igreja acha da dignidade do homem, o que se deve recomendar para a edificação da sociedade moderna, qual é o significado último da atividade humana. Finalmente, no último capítulo discute o papel que a Igreja quer desempenhar no mundo contemporâneo.

A segunda parte estuda sucessivamente a dignidade do matrimônio e da família, a promoção da cultura, da vida econômica e social, a vida da comunidade política, e por fim a paz e a promoção da comunidade das nações.

A Igreja em tudo isso, ainda que consciente de suas limitações, propõe-se a esta finalidade: ajudar com a sua luz onde for possível; ajudar com a sua esperança; a sua mão na mão dos homens, abertamente, para salvar o homem.

* Mons. Vitaliano Mattioli, nasceu em Roma em 1938, realizou estudos clássicos, filosóficos e jurídicos. Foi professor na Universidade Urbaniana e na Escola Clássica Apollinaire de Roma e Redator da revista “Palestra del Clero”. Atualmente é missionário Fidei Donum na diocese de Crato, no Brasil.

[Trad. TS]

Quatro constituições conciliares (Parte I)

Mons. Vitaliano explica as quatro Constituições do Concílio Vaticano II

Mons. Vitaliano Mattioli*

CRATO, sexta-feira, 21 de setembro de 2012 (ZENIT.org) – O Papa Bento XVI na Missa celebrada em Frascati (Itália) no dia 15 de julho de 2012 durante a homilia se expressou assim: “Os Documentos do Concílio contém uma riqueza enorme para a formação da nossa consciência”.

Com certeza o Concílio foi uma grande graça para a Igreja, mas ao longo destes 50 anos desde a sua abertura, nem sempre se ouviram vozes de acordo sobre a sua interpretação e atuação. Mais de uma vez o Vaticano foi apresentado como  uma linha de demarcação entre o pré e o pós-Concílio, ou seja numa linha de descontinuidade. Nada podia estar mais errado. Por isso Bento XVI poucos meses depois da sua eleição pontifícia considerou oportuno chamar a atenção sobre a correta interpretação com que se deve ler este Concílio. Aproveitou a ocasião de cumprimentos de Natal apresentando-lhes o Sagrado Colégio dos Cardeais, no dia 22 de dezembro de 2005.

Depois da primeira parte, começou a falar sobre o Concílio. Assim se expressou: “O último acontecimento deste ano, sobre o qual gostaria de me deter nesta ocasião, é a celebração do encerramento do Concílio Vaticano II, há quarenta anos. Tal memória suscita a interrogação: qual foi o resultado do Concílio? Foi recebido de modo correcto? O que, na recepção do Concílio, foi bom, o que foi insuficiente ou errado? O que ainda deve ser feito? Ninguém pode negar que, em vastas partes da Igreja, a recepção do Concílio teve lugar de modo bastante difícil… Surge a pergunta: por que a recepção do Concílio, em grandes partes da Igreja, até agora teve lugar de modo tão difícil? Pois bem, tudo depende da justa interpretação do Concílio ou como diríamos hoje da sua correcta hermenêutica, da justa chave de leitura e de aplicação. Os problemas da recepção derivaram do facto de que duas hermenêuticas contrárias se embateram e disputaram entre si. Uma causou confusão, a outra, silenciosamente mas de modo cada vez mais visível, produziu e produz frutos. Por um lado, existe uma interpretação que gostaria de definir “hermenêutica da descontinuidade e da ruptura”… Por outro lado, há a “hermenêutica da reforma”, da renovação na continuidade do único sujeito-Igreja, que o Senhor nos concedeu; é um sujeito que cresce no tempo e se desenvolve, permanecendo porém sempre o mesmo, único sujeito do Povo de Deus a caminho. A hermenêutica da descontinuidade corre o risco de terminar numa ruptura entre a Igreja pré-conciliar e a Igreja pós-conciliar”.

Para facilitar “Hermenêutica da Reforma,” Eu quero apresentar, ainda que de forma condensada, as 4 constituições conciliares. Em outra ocasião escrevi sobre os 9 documentos, clique aqui para ler.

A Constituição sobre a Sagrada Liturgia: Sacrosanctum Concilium, 4 de dezembro de 1963

A Constituição se limitou a definir as orientações para a reforma, cuja execução foi confiada em grande parte às Conferências episcopais (esta é a primeira atribuição de uma competência jurídica dada às Conferências Episcopais pelo Concílio). Esta Constituição fixa os princípios gerais da reforma e apresenta um caráter doutrinal. Faz ver como a liturgia é “o cume ao qual tenda a ação da Igreja, e ao mesmo tempo a fonte de onde mana a sua força” (n. 10). Fala sobre a participação ativa dos leigos: Discussão sobre a participação ativa dos leigos: “Os cristãos não assistam a este mistério de fé como estranhos ou expectadores mudos, mas participem na ação sagrada, consciente, piedosa e ativamente” (n. 48). Desenvolve claramente uma noção de Povo de Deus, no meio da qual a Hierarquia tem uma função de serviço. O Documento fala também da música sagrada, dos sacramentos, da liturgia das Horas, do ano litúrgico e da reforma do calendário. Paulo VI com o Motu Próprio ‘Sacram Liturgia’ (25 de Janeiro de 1964) deu início a uma primeira série de reformas. Com a Constituição Apostólica “Missale Romanum” (3 de Abril de 1969) entra em vigor a “Instrução Geral do Missal Romano e Introdução ao Lecionário”. Paulo VI, com a Carta Apostólica “Mysterii Paschalis” estabeleceu as normas para a reforma do calendário e do ano litúrgico.

A Constituição Dogmática sobre a Igreja: Lumen Gentium, 21 de novembro de 1964.

Este documento envolve toda a Igreja na sua estrutura e na sua atividade. O primeiro capítulo fala do mistério da Igreja que “é, no Cristo, como que o Sacramento, ou seja, o sinal e o meio da união íntima com Deus e da unidade de todo o gênero humano” (n.1, e descreve a relação da Igreja de Deus, Pai, Filho e Espírito Santo. O segundo capítulo apresenta a Igreja como Povo de Deus, constituído pelo Batismo e do qual a cabeça é Cristo, a caminho através da história e destinado a reunir todos os homens. Lembra os laços entre a Igreja e os Cristãos não católicos, seus relacionamentos com os não-cristãos e afirma os caráter missionário do Povo de Deus. Apresenta em seguida os membros do Povo de Deus: a hieraquia (bispos, sacerdotes e diáconos) e os leigos. O terceiro, sobre a hierarquia, afirma a colegialidade do episcopado (os bispos sucessores dos apóstolos, ao redor do Papa sucessor de Pedro, seu chefe, receberam de Cristo a responsabilidade da Igreja universal) e decide que os Episcopados locais podem restaurar o diaconado como uma Ordem permanente, e conferir esta Ordem a homens casados. O capítulo quarto, sobre os leigos, mostra a eles a participação na vida e na missão da Igreja (culto, proclamação do Evangelho, orientação para o Cristo da vida e das atividades de toda a humanidade). O quinto capítulo fala da vocação à santidade por parte de todos os membros do Povo de Deus. O capítulo sexto, sobre os religiosos, explica a função da vida religiosa em relação à vida espiritual de todo o povo cristão. O sétimo capítulo apresenta a Igreja, peregrina na terra, para a vida eterna, em comunhão com a Igreja celeste. Finalmente o capítulo oitavo apresenta a função materna da Virgem Maria no mistério de Cristo e da Igreja. Está em sintonia com este texto que Paulo VI, no dia 21 de novembro de 1954, deu à Virgem o título de Mãe da Igreja, porque ela, em quanto mãe de Cristo, é também mãe de todo o Povo de Deus, seja dos fiéis como dos pastores.

Ao documento foi adicionado por vontade explícita de Paulo VI, uma “Nota Explicativa Prévia”, contendo alguns fundamentos sobre o texto para evitar interpretações erradas. Esta Nota deve ser considerada parte integral do mesmo Documento.

A segunda parte será publicada no dia 24 de Setembro.

Trad. TS

Comunidade católica diante da legalização do aborto previsto no Anteprojeto do Código Penal brasileiro (Parte II)

Conversa organizada por ZENIT entre o Prof. Paulo Fernando e o Pe. Paulo Ricardo

Por Thácio Siqueira

BRASILIA, quarta-feira, 5 de setembro de 2012 (ZENIT.org) – São três os valores inegociáveis segundo Bento XVI – em discurso ao Partido Popular Europeu no ano de 2006: vida, família monogâmica e educação dos filhos.

Valores estes que não podem “seguir a arte da política e da negociação”, – afirma Pe. Paulo Ricardo – em uma conversa organizada por ZENIT entre o Prof. Paulo Fernando Melo, vice-presidente Pró-vida e pró-família e membro da comissão de bioética da arquidiocese de Brasília, e o Pe. Paulo Ricardo Azevedo Junior, do clero da arquidiocese de Cuiabá, e famoso pregador brasileiro.

Oferecemos aos nossos leitores a segunda parte dessa reflexão. Para ler a primeira parte, publicada ontem, clique aqui.

Prof. Paulo Fernando: diante desse quadro da cultura da morte, o que, efetivamente, uma pessoa de bem, um cidadão católico, pode fazer? Será que estaríamos na beira do abismo e realmente não tem mais o que se fazer?

Pe. Paulo Ricardo: Devemos lembrar duas coisas importantes. Primeiro, nós não somos uma minoria insignificante. Nós somos uma maioria. Mas infelizmente somos uma maioria emudecida porque a classe falante está toda contaminada com a mentalidade anticristã e uma maioria mal articulada, não organizada. Nós então, precisamos, em primeiro lugar, nos conscientizar. Depois, uma vez conscientizados daquilo que é a situação que nós vivemos, estar dispostos a nos articular e trabalhar concretamente para este tipo de política favorável à vida. Nós precisamos crer no seguinte: a ação de Deus na história, é sempre uma ação em que, aquele que era aparentemente somente um Davi, pequenino, que lutava contra um Golias, termina alcançando a vitória. Então, existe, em nós, uma consciência de nossa pequenez. Apesar de sermos muitos, nós sabemos que qualquer vitória deve ser uma vitória de Deus. Mas, a vitória de Deus só acontece quando nós agimos. Qualquer pessoa que trabalha nesse campo, na evangelização, no meio da política e na ação social, e trabalha a favor das coisas de Deus, já experimentou o fato de que as nossas pequenas ações, de pequenos Davis, são potenciadas enormemente por Deus, de tal forma que embora sejam poucos os cristãos e católicos conscientes no âmbito da política, as nossas ações são agraciadas. Deus nos dá a graça. Por isso podemos contar com ela. Podemos contar com o fato de que uma pequena pedrinha pode causar uma grande avalanche, de que o pequeno Davi pode sempre destruir o exército dos Filisteus.

Prof. Paulo Fernando: o senhor falou que Deus nos pede a luta e não a vitória, mesmo porque a vitória já é nossa, em Jesus. Agora, qual o conselho que o senhor dá às pessoas que se sentem vocacionadas para isso? Como o senhor falou, que sejam preparadas, que sejam compromissadas, que tenham uma postura como pai de família, como patrão, como empregado, como pessoa engajada na comunidade, na sua paróquia, na sua igreja, na sua diocese; e por que muitas vezes, não há esse estímulo para que as pessoas de bem possam ingressar também no mundo da política?

Pe. Paulo Ricardo: O princípio da sabedoria é o temor de Deus, diz a Sagrada Escritura. Nós temos que ter a plena consciência de que não estamos nesse mundo para vivermos uma comodidade e um paraíso aqui nessa terra. Nós estamos aqui para preparar o céu. Estamos aqui para realizar a vontade de Deus que preparou para nós uma felicidade no céu. Então, qualquer pessoa que entra nessa luta sem fé na salvação que nos é dada por Deus e na esperança de alcançá-la, é uma pessoa que tem uma grande probabilidade de perder a luta porque o inimigo conta com isso. O inimigo – e nosso inimigo maior é Satanás, o demônio, e não as pessoas – conta com o fato que nós, amedrontados, vivamos um cristianismo, mas um cristianismo burguês, acomodado, onde sim faço a vontade de Deus, desde que isso não me custe muito; desde que isso não tenha um preço. A partir do momento em que a fidelidade a Deus começa a exigir um preço, as pessoas desistem. Os conselhos que posso dar bem concretamente aos cristãos leigos e aos sacerdotes inclusive, é ter os olhos fixos em Deus, no céu, para não nos deixarmos distrair pelas seduções do mundo, pela comodidade aqui desta terra. É uma luta a vida do homem sobre a terra. Nós estamos aqui para lutar. E sabemos que Deus irá vencer. Não há nenhuma dúvida de que Deus vencerá. A única pergunta é: de que lado nós estaremos quando Deus vencer? De que lado nós estaremos quando Ele proclamar a sua vitória. Então, precisamos viver esse mundo com os olhos fixos no céu. Sabendo que é essa a nossa missão. Estamos aqui na terra preparando o nosso céu. Qualquer coisa que se distraia dessa realidade vai resultar numa traição. Nós precisamos saber que um dia estaremos diante do trono da graça, seremos julgados por Deus, e que precisamos ser fieis a Ele.

Prof. Paulo Fernando: e agora, nas considerações finais, o senhor acha que nós devemos rezar pela conversão desses abortistas? Quais são as nossas intenções nas nossas orações nessa luta contra a cultura da morte?

Pe. Paulo Ricardo: Veja, a realidade espiritual deve estar sempre ancorada também na ação. As duas coisas devem caminhar juntas: rezar pela conversão deles, rezar também pelas famílias, mulheres, crianças, pessoas que estão envolvidas nos crimes de aborto, mas sobretudo precisamos ter em mente o fato de que no Brasil estamos vivendo uma situação de extrema urgência. Nós temos nesse momento, duas realidades extremamente urgentes nesse país. A primeira que é toda uma ação do executivo, onde o ministério da saúde e a secretaria para a defesa dos direitos das mulheres estão implantando uma série de procedimentos para facilitar o aborto cometido através de medicamentos por mulheres, e estamos também diante de um projeto do código penal que, se não legaliza o aborto de fato, pelo menos o legaliza na prática porque atenua enormemente a penalidade do aborto e o torna uma daquelas infrações de menor importância e portanto não passíveis de punição. Essas duas realidades são verdadeiro golpe na democracia brasileira. Nós brasileiros somos, na sua maioria, contrários à prática infame do aborto e gostaríamos que isso continuasse assim. O valor da vida humana é um direito inegociável, é algo que nós não podemos ceder. Essa realidade deve ser defendida por nós católicos, antes de tudo na oração, na nossa confiança em Deus e entrega à Nossa Senhora, mas também na ação, onde nós estejamos dispostos a pagar o preço pela nossa fidelidade a Deus. Existe um livro escrito por um autor protestante, chamado C S Lewis, “Cartas de um diabo ao seu aprendiz”. Nesse livro o demônio mais velho ensina ao mais novo como levar uma alma ao inferno. E diz assim: mantenha as orações dele, ou seja, da pessoa que você quer levar ao inferno, muito devotas e espirituais, fazendo com que, no entanto, ele não se preocupe nunca com as doenças das pessoas que estão ao seu redor, das suas necessidades concretas e com a ajuda que ele poderia prestar às pessoas que mais necessitam. Precisamos rezar, confiar em Deus, mais precisamos também agir. Por mais que seja uma ação humanamente irrisória, mas esta pequena ação de milhões de pequenos Davis serão potenciadas por Deus, que pela sua graça dará vitória ao seu povo.

Comunidade católica diante da legalização do aborto previsto no Anteprojeto do Código Penal brasileiro (Parte I)

Conversa organizada por ZENIT entre o Prof. Paulo Fernando e o Pe. Paulo Ricardo

Por Thácio Siqueira

BRASILIA, terça-feira, 4 de setembro de 2012 (ZENIT.org) – São três os valores inegociáveis segundo Bento XVI – em discurso ao Partido Popular Europeu no ano de 2006: vida, família monogâmica e educação dos filhos. Valores estes que não podem “seguir a arte da política e da negociação”, – afirma Pe. Paulo Ricardo – em uma conversa organizada por ZENIT entre o Prof. Paulo Fernando Melo, vice-presidente Pró-vida e pró-família e membro da comissão de bioética da arquidiocese de Brasília, e o Pe. Paulo Ricardo Azevedo Junior, do clero da arquidiocese de Cuiabá, e famoso pregador brasileiro.

Oferecemos aos nossos leitores a primeira parte dessa reflexão. A segunda será publicada amanhã, quarta-feira, 5 de Setembro.

Prof. Paulo Fernando: Como é que o senhor vê a situação da comunidade católica, da sociedade no geral, diante dessa questão da legalização do aborto previsto no anteprojeto do código penal?

Pe. Paulo Ricardo: Na realidade, o católico está, infelizmente alienado da vida política. Enquanto católico criou-se uma mentalidade de que porque o Estado é laico as pessoas não podem manifestar seus valores éticos e religiosos no mundo da política. Essa mentalidade é completamente absurda porque nós sabemos que toda lei manifesta um Ethos, toda lei manifesta uma visão de mundo e um quadro de valores. Ora, o Estado pode ser laico, mas os brasileiros são religiosos. E eles têm não somente o direito mas o dever de levar esse seu Ethos à própria confecção das leis. Ora, por causa dessa ideologia laicista o católico introjetou uma espécie de minoridade. Enquanto ele é religioso, católico, possui as suas convicções, mas é como se fosse um cidadão de segunda categoria. Só tem direito de se manifestar aquele que é ateu, materialista militante… o católico fica de lado. Na realidade precisamos acordar o católico consciente, convicto, praticante, fiel à Igreja e ao Papa, para a sua missão, a sua vocação no mundo da política. O diabo, na verdade, fez o trabalho dele muito bem feito. Colocou na cabeça do católico que política é para gente soncha, para pessoa soncha. Portanto, ele não deve imiscuir-se nesse ponto. É assim que, então, temos no Brasil uma situação bastante esdrúxula de uma maioria silenciosa que é governada quase que ditatorialmente por uma minoria que conseguiu amordaçar essa maioria.

Prof. Paulo Fernando: Padre, nós estamos em anos de eleições, para prefeito e vereador. O que diz a doutrina social da Igreja da participação efetiva de católicos na política? Quais são os critérios de um bom candidato para que o eleitor faça uma boa escolha?

Pe. Paulo Ricardo: Na verdade, nós devemos sempre olhar para o fato de que a Igreja não tem candidatos próprios, mas a Igreja orienta o fiel para escolher candidatos que trabalhem para o bem comum, homens e mulheres que tenham um histórico e uma competência para trabalhar para o bem comum. Essa realidade incide fortemente quando nós olhamos para o curriculum do candidato e vemos que ele tem ou não um histórico de defesa daqueles valores que o Papa Bento XVI chama de valores não negociáveis.

São três tipos de valores não negociáveis, praticamente, que o Papa colocou num discurso dele ao Partido Popular Europeu no ano 2006 (Clique aqui para ler o texto)  Primeiro: respeito à vida humana desde a sua concepção até a sua morte natural. Aqui entra toda a questão do aborto, da eutanásia, etc. Segundo: a família, constituída por um casamento monogâmico, único, indissolúvel, entre um homem e uma mulher. E esse é um valor que a Igreja considera não negociável. Ou seja, não há aqui a arte da política e da negociação. E terceiro: a educação dos filhos, ou seja, a liberdade dos pais de educarem os seus filhos sem ingerência do Estado naquilo que são os valores a serem transmitidos aos filhos.

Essas três colunas mestras estão sendo, hoje, atacadas frontalmente pelo abortismo, pelo gaysismo, pelo feminismo, e por um Estado cada vez mais aparelhado por militantes de esquerda que querem exatamente solapar essas colunas mestras da moralidade da civilização ocidental, que não é só algo específico nem do católico e nem do cristão, mas são os valores encima dos quais foi construída a civilização ocidental.

Prof. Paulo Fernando: Padre, o Senhor poderia esclarecer-nos se, de acordo com a doutrina e o magistério da Igreja, um eleitor que vote num candidato ou num partido que, sabidamente é contrário a esses valores que o senhor falou – se o partido claramente no seu programa defende a legalização do aborto – se, teoricamente, esse eleitor, votando deliberadamente nesse partido e nesse candidato, estaria incorrendo em pecado?

Pe. Paulo Ricardo: De fato existe uma situação bastante delicada no Brasil porque a realidade do nosso país é que, praticamente, todos os partidos tem nas suas plataformas, nos seus programas, políticas contrárias a esses valores. O que, na verdade, nós deveríamos atentar é para o fato não se os partidos tem ou não esse tipo de valores, mas se o partido permite ou não uma liberdade ao candidato de exercer o seu mandato a partir dos valores que ele professa. De tal forma que não aja uma rigidez ou uma disciplina interna no partido que obrigue os candidatos, uma vez eleitos, a uma camisa de força doutrinal. Então, nesse caso, se uma pessoa sabe que o partido tem esse tipo de disciplina interna, e que, portanto, não irá permitir ao candidato o exercício do seu mandato conforme os valores que o próprio candidato professa, então o eleitor tem a sua consciência gravemente honerada na hora de votar, porque sabe que está votando não num candidato com valores cristãos, mas num partido que irá impor seus valores anticristãos e imorais.